Ministério Público Estadual - Rio Grande do Norte - Analista de Tecnologia da Informação - Banco de Dados - FCC - Fundação Carlos Chagas - 2010 - Prova Objetiva
Os bons selvagens mirins
Garotos podem ser maus? Embora a visão romantizada da infância sugira a existência de uma pureza primordial, crianças, como qualquer outro animal social, são capazes tanto de atitudes do mais profundo egoísmo − de crueldade mesmo − quanto de gestos altruístas. É um clássico caso de copo meio cheio ou meio vazio. E a pergunta interessante é: por que tanta gente deixa seletivamente de ver os fatos que não lhe convêm para sustentar o mito da infância angelical? Parte da resposta está na biologia. Bebês e crianças comovem e mobilizam nossos instintos de cuidadores. Estes serezinhos foram "desenhados" com características que exploram nossos vieses sensórios. Tais tra- ços são há décadas conhecidos de artistas como Walt Disney. E, se essa é a base biológica do "amor às crianças", sobre ela passaram a operar poderosos fatores culturais, que reforçaram essa predisposição natural até torná-la uma ideologia. Enquanto bebês nasciam aos borbotões e morriam em proporções parecidas − o que ocorreu durante 99,9% da história −, víamos o óbito de filhos como algo, se não natural, ao menos esperado. Evitávamos investir tudo num único rebento. Com o surgimento da família burguesa, a partir do século 16, as coisas começaram a mudar. Ter um bebê e vê-lo chegar à idade adulta deixou de ser uma aposta temerária. Estava aberto o caminho para que o amor paterno pudesse prosperar. Foi nesse contexto que surgiram, no século 18, pedagogos como Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), que criou um novo conceito de infância. Jovens não deveriam ser apenas ensinados, mas educados, respeitando-se as especificidades de seu desenvolvimento natural. O problema é que essa ideia bastante plausível de Rousseau veio misturada com outras, menos razoáveis, como a balela de que o homem é originalmente bom, mas a sociedade o corrompe. Não foi preciso muito para que crianças virassem bons selvagens mirins, a encarnação da bondade primeva. O fato de Rousseau ter se tornado o filósofo mais influente da história, especialmente no pensamento de esquerda, só aumentou o vigor do mito e o tamanho do estrago provocado.
(Hélio Schwartzman, Folha de S. Paulo)
A expressão É um clássico caso de copo meio cheio ou meio vazio é utilizada, no contexto do primeiro parágrafo, para figurar a:
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a)
predominância, nas crianças, da índole maldosa sobre as inclinações altruístas. |
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b)
equivalência, na idade infantil, entre as atitudes egoístas e os instintos naturais. |
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c)
dificuldade de se reconhecer, nas atitudes infantis, a primazia do egoísmo ou do altruísmo. |
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d)
relação de causa e efeito entre o instinto natural das crianças e seus gestos altruístas. |
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e)
supremacia, no mundo infantil, dos instintos naturais sobre a pureza primordial. |
No 2.º parágrafo, afirma-se que os adultos:
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a)
por força de suas convicções morais, veem as crianças como seres invariavelmente inocentes. |
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b)
não obstante seus instintos paternais, deixam de reconhecer as efetivas virtudes das crianças. |
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c)
por razões de ordem biológica, cuidam tão somente dos fatos que desabonam a conduta infantil. |
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d)
em razão de seus instintos protecionistas, enxergam nas crianças apenas o que a eles convém. |
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e)
em vista de suas boas intenções, contrariam seus instintos na hora de avaliar as crianças. |
Atente para as seguintes afirmações:
I. No 3.º parágrafo, considera-se que há razões de ordem biológica para que os adultos deixem de transformar em ideologia a idealização que promovem da infância.
II. No 4.º parágrafo, a convicção de Rousseau é referida em reforço da tese de que a criança não deve ser vista como um ser naturalmente puro.
III. No 4.º parágrafo, afirma-se que um novo conceito de infância, proposto por Rosseau, dizia respeito a novas práticas de educação.
Em relação ao texto, está correto APENAS o que se afirma em:
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a)
I. |
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b)
I e II. |
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c)
II. |
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d)
II e III. |
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e)
III. |
Considerando-se o contexto, traduz-se adequadamente o sentido de um segmento em:
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a)
uma pureza primordial (1.º parágrafo) = uma inocência primitiva. |
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b)
vieses sensórios (2.º parágrafo) = elucubrações oblíquas. |
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c)
predisposição natural (3.º parágrafo) = pressuposição primitiva. |
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d)
aposta temerária (3.º parágrafo) = lance temeroso. |
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e)
ideia bastante plausível (4.º parágrafo) = tese bem notória. |
As normas de concordância verbal estão plenamente observadas na frase:
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a)
Não basta ensinar conteúdos às crianças, pensava Rousseau; impõe-se educá-las, mas de modo que não as deforme a sociedade. |
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b)
Não se esperem das crianças que sejam puras ou angelicais, pois elas já nasceriam com os instintos da agressão e da crueldade. |
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c)
Houve tempos em que o índice de mortalidade dos bebês atingiam um patamar que hoje suscitariam sérias sindicâncias. |
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d)
A genialidade de Walt Disney teria reforçado, nos traços dos desenhos, a imagem de inocência que se atribuíam às crianças. |
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e)
Estão em nossos instintos de adultos o impulso para que consideremos, em princípio, frágeis e indefesas todas as crianças. |
Está plenamente adequada a correlação entre tempos e modos verbais na frase:
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a)
Por que tanta gente deixaria de ver os fatos que não lhe conviessem, para sustentar, assim, o mito da infância angelical? |
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b)
Essas criaturinhas gozariam de um prestígio que só reconhecêssemos nela em virtude dos nossos vieses sensórios. |
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c)
Se for essa a base biológica do nosso amor às crianças, passam a operar sobre ela os valores culturais que defendêssemos. |
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d)
Para Rousseau, as crianças que não forem desviadas de seu caminho natural teriam desfrutado de pleno equilíbrio vital. |
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e)
Não fosse a estilização dos traços das crianças, nos desenhos de Walt Disney, a imagem da pureza infantil não terá sido tão forte. |
Estava aberto o caminho para que o amor paterno pudesse prosperar. A afirmação acima tem nova redação, igualmente correta e de sentido equivalente, em:
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a)
O amor paterno estaria abrindo um caminho em cujo pudesse prosperar. |
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b)
Abria-se o caminho que ao amor paterno possibilitaria prosperar. |
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c)
Poderia prosperar nesse caminho o amor paterno que a ele se abria. |
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d)
Ao amor paterno permitiria prosperar-se nessa abertura do caminho. |
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e)
Abrira-se o caminho aonde poderia vir a prosperar o amor paterno. |
No contexto do 3.º parágrafo, constituem uma causa e seu efeito, nessa ordem, os seguintes fatos:
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a)
é a base biológica do "amor às crianças" / reforçaram essa predisposição natural. |
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b)
bebês nasciam aos borbotões / morriam em proporções parecidas. |
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c)
surgimento da família burguesa, a partir do século 16 / as coisas começaram a mudar. |
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d)
Ter um bebê e vê-lo chegar à idade adulta / deixou de ser uma aposta temerária. |
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e)
víamos o óbito de filhos / como algo, se não natural, ao menos esperado. |
É preciso corrigir a pontuação da frase:
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a)
Não obstante a imagem de candura, as crianças podem ser perversas por conta dos instintos, manifestação que, aliás, nos comandam a todos. |
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b)
Não apenas as crianças, também os adultos cedem aos instintos primitivos, de cuja manifestação, muitas vezes, tendemos a nos envergonhar. |
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c)
O autor não se mostra nada simpático à tese da bondade natural, proposta e defendida por Rousseau, embora admita o grande prestígio de que goza esse filósofo. |
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d)
No século 18, marcado pela ação dos pensadores iluministas, pedagogos como Rousseau, desejosos de mudanças, propuseram teses revolucionárias. |
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e)
Deve-se à aparência meiga das crianças, boa parte da crença de que elas são seres angelicais, e por isso, incapazes de cometer crueldades. |
Caso um opositor das teses de Rosseau a ele se dirigisse formalmente, uma redação correta seria:
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a)
Venho à presença de Vossa Eminência para manifestar meu desagrado em relação à tese da bondade natural. |
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b)
Poderia Sua Senhoria explicitar outros argumentos que melhor justifiquem vossa tese? |
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c)
Não posso concordar com as teses supostamente revolucionárias que Vossa Excelência vindes defendendo. |
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d)
Senhor: acredito que, ao apresentar suas teses sobre a bondade natural, reveles um pensamento tendencioso. |
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e)
Vossa Senhoria está, a meu ver, inteiramente equivocada quando defende as teses sobre a bondade natural. |