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Comentários / ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) - Técnico Administrativo - FUNCAB (Fundação Professor Carlos Antonio Bittencourt) - 2016


Texto I

Texto para responderás questões de 01 a 10.

O espelho

Esboço de uma nova teoria da alma humana

Quatro ou cinco cavalheiros debatiam, uma noite, várias

questões de alta transcendência, sem que a disparidade dos

votos trouxesse a menor alteração aos espíritos. A casa ficava no

morro de Santa Teresa, a sala era pequena, alumiada a velas,

cuja luz fundia-se misteriosamente com o luar que vinha de fora.

Entre a cidade, com as suas agitações e aventuras, e o céu, em

que as estrelas pestanejavam, através de uma atmosfera límpida

e sossegada, estavam os nossos quatro ou cinco investigadores

de coisas metafísicas, resolvendo amigavelmente os mais

árduos problemas do universo.

Por que quatro ou cinco? Rigorosamente eram quatro os

que falavam; mas, além deles, havia na sala um quinto

personagem, calado, pensando, cochilando, cuja espórtula no

debate não passava de um ou outro resmungo de aprovação.

Esse homem tinha a mesma idade dos companheiros, entre

quarenta e cinquenta anos, era provinciano, capitalista,

inteligente, não sem instrução, e, ao que parece, astuto e

cáustico. Não discutia nunca; e defendia-se da abstenção com

um paradoxo, dizendo que a discussão é a forma polida do

instinto batalhador, que jaz no homem, como uma herança

bestial; e acrescentava que os serafins e os querubins não

controvertiam nada, e, aliás, eram a perfeição espiritual e eterna.

[...]

Vai senão quando, no meio da noite, sucedeu que este

casmurro usou da palavra, e não dois ou três minutos, mas trinta

ou quarenta. A conversa, em seus meandros, veio a cair na

natureza da alma, ponto que dividiu radicalmente os quatro

amigos. Cada cabeça, cada sentença; não só o acordo, mas a

mesma discussão tornou-se difícil, senão impossível, pela

multiplicidade das questões que se deduziram do tronco principal

e um pouco, talvez, pela inconsistência dos pareceres. Um dos

argumentadores pediu ao Jacobina alguma opinião, - uma

conjetura, ao menos.

- Nem conjetura, nem opinião, redarguiu ele; uma ou

outra pode dar lugar a dissentimento, e, como sabem, eu não

discuto. Mas, se querem ouvir-me calados, posso contar-lhes um

caso de minha vida, em que ressalta a mais clara demonstração

acerca da matéria de que se trata. Em primeiro lugar, não há uma

só alma, há duas...

-Duas?

- Nada menos de duas almas. Cada criatura humana

traz duas almas consigo: uma que olha de dentro para fora, outra

que olha de fora para dentro... Espantem-se à vontade, podem

ficar de boca aberta, dar de ombros, tudo; não admito réplica. Se

me replicarem, acabo o charuto e vou dormir. Aalma exterior pode

ser um espírito, um fluido, um homem, muitos homens, um objeto,

uma operação. Há casos, por exemplo, em que um simples botão

de camisa é a alma exterior de uma pessoa; - e assim também a

polca, o voltarete, um livro, uma máquina, um par de botas, uma

cavatina, um tambor, etc. Está claro que o ofício dessa segunda

alma é transmitir a vida, como a primeira; as duas completam o

homem, que é, metafisicamente falando, uma laranja. Quem

perde uma das metades, perde naturalmente metade da

existência; e casos há, não raros, em que a perda da alma exterior

implica a da existência inteira. Shylock, por exemplo. A alma

exterior daquele judeu eram os seus ducados; perdê-los equivalia

a morrer. ''Nunca mais verei o meu ouro, diz ele a Tubal; é um

punhal que me enterras no coração." Vejam bem esta frase; a

perda dos ducados, alma exterior, era a morte para ele. Agora, é

preciso saber que a alma exterior não é sempre a mesma...

[...]

ASSIS, Machado de. Obra Completa. Rio de Janeiro: Nova

Aguilar 1994. v. II. (fragmento)

Questão:

O subtítulo, “esboço de uma nova teoria da alma humana”, a afirmação do narrador no primeiro parágrafo de que os personagens “debatiam questões de alta transcendência” e eram “investigadores de coisas metafísicas [...] resolvendo amigavelmente os mais árduos problemas do universo” colocam diante do leitora:

Resposta errada
a) verdadeira universalidade que se fortalece em uma perspectiva teológica, subjetiva e prática do homem.
Resposta errada
b) astúcia dos ouvintes, reafirmada toda uma visão de homem arraigada na cultura ocidental no microcosmo da sociedade humana.
Resposta correta
c) universalidade da temática do conto: não abordará as mazelas de uma cidade ou classe social, mas sim a questão posta pela seguinte pergunta: o que é o homem?
Resposta errada
d) interioridade que confere à figura humana um papel na estruturação das particularidades deflagradas de cada indivíduo.
Resposta errada
e) individualidade do assunto tão intricado como o da natureza da alma humana que aponta a importância de se dar menos atenção às exigências do mundo social.

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